O mais novo não é necessariamente melhor

Publicado por 21 de Maio de 2018 em

Tutoriais e Fundamentos

Esta é a tradução para o Português do quinto de uma série de 36 blogs, baseado em uma lista de’Conceitos Fundamentais’ desenvolvidos pela equipe do projeto Informed Health Choices.    Leia a versão em Inglês aqui.  Agradecimentos à Igor Henrique Pinho Volker  e à Cochrane Brazil Rio de Janeiro pela tradução.

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A novidade e o preço de um tratamento são dois fatores que podem influenciar o que pensamos a respeito dele. Podemos fazer certas suposições de forma automática: a última droga ou o novo tratamento precisam ser significativamente melhores que um tratamento já existente, certo? E o tratamento mais caro deve ser efetivo, certo? Bem, não necessariamente…

Alguns exemplos interessantes (e preocupantes) para mostrar que drogas caras e novas não são necessariamente melhores dos que os tratamentos já estabelecidos…

Aumento arbitrários de preços

O custo de EpiPens (do inglês: easily injectable epinephrine devices) para reações alérgicas graves foi um assunto bastante controverso recentemente. Seu preço aumentou mais de 450% desde 2004. O que aconteceu? Você talvez presuma que, para justificar esse aumento de preço, os dispositivos EpiPens tenham sido melhorados substancialmente neste tempo. Mas infelizmente não. Ao contrário, esse aumento de preço ocorreu porque praticamente só havia uma companhia, a Mylan, vendendo EpiPens na época em que sua demanda estava aumentando. Com pouca regulação, a Mylan era relativamente livre para aumentar o preço de EpiPens múltiplas vezes, enquanto crescia a demanda através do marketing (ou “conscientização”).

De forma similar, a Turing aumentou o preço do Daraprim®, droga usada para tratar infecções parasitárias, como a malária, em mais de 5000% em 2015.

Drogas “me-too (eu também)”

Na Finlândia, um jornalista científico criticou abertamente médicos por prescreverem grandes quantidades de esomeprazol, droga designada para diminuir a secreção gástrica ácida. Por quê? Essa droga era nova, uma variante menor do já estabelecido omeprazol.

Esomeprazol é um exemplo da droga “me-too”; onde indústrias criam várias drogas muito semelhantes, que não são necessariamente avanços na versão da droga já existente. No Canadá, Morgan et al. concluíram a partir de sua análise, em 2005, que “em British Columbia, a maioria (80%) dos gastos em drogas, entre 1996 e 2003, é explicada pelo uso de novos produtos farmacêuticos patenteados que não ofereceram melhorias substanciais em alternativas menos dispendiosas disponíveis antes de 1990”. Drogas “me-too” são frequentemente um ralo financeiro substancial e desnecessário e podem dar falsas esperanças para os pacientes.

Esses são alguns exemplos, mas que claramente ilustram o fato de que só porque uma droga é cara, não é necessariamente efetiva. Nem é necessariamente uma melhoria, em relação a uma versão anterior dessa droga.

Tratamentos de marca, novos e caros, também precisam ser honestamente testados…

A frequente suposição de que os tratamentos novos e caros devem ser melhores do que os tratamentos disponíveis mais antigos e mais baratos é errada.

Como sabemos que esses pressupostos estão errados?

  • Novos resultados que chamam a atenção, com frequência não se mostram promissores após testes adicionais. Por exemplo, em 2003, pesquisadores analisaram 101 estudos publicados nas melhores revistas científicas, entre 1979 e 1983, que afirmavam que uma nova terapia ou tecnologia médica que estavam sendo desenvolvidas eram muito promissoras. Apenas cinco delas, descobriram os pesquisadores, chegaram ao mercado dentro de uma década.
  • Quando falamos em indústria, podemos erroneamente considerar que as únicas coisas que impulsionam o desenvolvimento e o preço de um tratamento são sua eficácia e segurança. Mas vamos ser claros: o objetivo principal da indústria farmacêutica e outras companhias de saúde é prosperar (Portanto, não é de se admirar que a maioria delas invista mais em marketing do que em pesquisa). Para a indústria farmacêutica, mudanças muito pequenas na molécula principal de uma droga produzem melhor retorno do que investimentos em grandes e arriscadas inovações. Através de marketing inteligente, persuadir os profissionais e os pacientes de que uma pequena mudança em uma droga produz uma diferença significativa em quão eficiente ou segura ela é, não é tão difícil. As empresas também podem manipular arbitrariamente os preços.
  • Quando devidamente testados, novos tratamentos raramente são melhores que os já existentes. Novos tratamentos deveriam ser comparados com as melhores alternativas em estudos bem desenhados (idealmente, estudos randomizados e controlados (ECR)). Então, o que você imaginaria sobre a probabilidade de um novo tratamento aleatório qualquer ser melhor que a alternativa já estabelecida? Pouquíssima chance? Quase certeza? A melhor estimativa parece vir de um grupo de pesquisadores que concluíram em 2012, que “a sociedade pode esperar que pouco mais da metade de novos tratamentos experimentais irão provar ser melhores que os já estabelecidos quando testados em ECR, mas poucos serão substancialmente melhores”.
  • No atual sistema de regulação, para um novo tratamento ir para o mercado, não há necessidade de que ele seja mais efetivo que o melhor tratamento alternativo já existente. Além disso, alguns efeitos colaterais e danos associados ao tratamento podem demorar a aparecer. Isso significa que a segurança a longo prazo de um novo tratamento é, com frequência, desconhecida antes do tratamento ir para o mercado e ser utilizado em grande escala. Este é especialmente o caso com efeitos colaterais e danos raros.

Para que se escolham os tratamentos mais seguros, mais efetivos, e melhor tolerados, os profissionais, financiadores e pacientes não podem ter sua atenção desviada por todo barulho que preço e novidade podem criar. Em última análise, como discutido durante este artigo, devemos comparar todos os tratamentos de forma justa.

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