Razão de verossimilhança e curva ROC
Publicado por 7 de Junho de 2023 em Estudantes para Melhores Evidências
Contexto
Este post discutirá a razão de verossimilhança positiva (RV+), razão de verossimilhança negativa (RV−) e curvas ROC. Para essa discussão vamos utilizar a tabela 2×2
O Quadro 1 apresenta, de modo simplificado, os quatro resultados possíveis no processo de investigação diagnóstica (tabela 2 x 2)
Razão de Verossimilhança (RV)
A razão de verossimilhança, ou likelihood ratio, é definida como a probabilidade de se obter um determinado resultado (positivo ou negativo) nos doentes dividida pela probabilidade de se obter o mesmo resultado em alguém sem a doença. De forma mais simples, a RV positiva pode ser definida como a probabilidade dos verdadeiros positivos sobre a probabilidade dos falsos positivos. Semelhantemente, a RV negativa é a probabilidade dos falsos negativos sobre a probabilidade dos verdadeiros negativos. [7]
A razão da verossimilhança é uma medida alternativa à sensibilidade e especificidade, quando estamos falando de análise de testes diagnósticos, ou seja, é uma outra forma de analisar a validade desses testes e pode ser obtida a partir de valores de sensibilidade e especificidade prévios, conforme fórmulas abaixo. [7]
De que forma podemos interpretar a razão de verossimilhança, então? No caso da RV positiva, quanto mais positiva ela for, podemos dizer que mais indicativo da doença é o teste. Bons testes diagnósticos têm, por exemplo, RV positiva > 10. Já a RV negativa nos mostra quantas vezes mais é provável de encontrarmos um resultado negativo em pessoas doentes do que um resultado negativo em pessoas sadias. Bons testes diagnósticos têm RV negativa < 0,1.
Mas qual é a vantagem de se utilizar a Razão de Verossimilhança em comparação às demais medidas, como sensibilidade e especificidade? Diferentemente dessas medidas, que dizem sobre a validade do teste como um todo, a RV nos apresenta essa validade para cada um dos resultados ou características do teste. Um exemplo hipotético: um determinado teste de imagem para detecção de câncer pode ter uma RV+ maior para tamanhos de tumor entre 2-3 cm do que para tamanhos de tumor entre 1-2 cm ou para tamanhos de tumor acima de 3 cm. Assim, a RV nos diz que esse teste é melhor para o diagnóstico de câncer em valores intermediários de tumor (2-3cm), mas não é tão bom nos valores extremos (entre 1-2 cm ou acima de 3 cm)
Teste seu conhecimento
Suponha o mesmo teste do artigo passado, em que 1.000 profissionais da saúde de um município têm suspeita diagnóstica de Covid-19 e são submetidos a um teste laboratorial, chamado “Coviteste” que acabou de ser desenvolvido mais barato e mais rápido do que o RT-PCR (teste referência). O Quadro 2 apresenta os resultados do “Coviteste” e do RT-PCR para estes 1.000 profissionais.
Agora calcule os valores de razões de verossimilhança positivo e negativo do “Covitest” a partir das informações do Quadro 2. Confira no Quadro 3 as respostas corretas.
Curva ROC
A curva ROC, por sua vez, do inglês Receiver Operator Characteristic Curve (Curva Característica de Operação do Receptor) é uma variável estatística sob a forma de uma curva em um gráfico, que nos ajuda a validar um teste, ao compararmos a sua respectiva curva com a dos demais testes. [6]
Ela é obtida pela sensibilidade no eixo das ordenadas(vertical), e pelo valor 1-especificidade ou valores falsos positivos no eixo das abscissas (horizontal). Logo, quanto mais para cima e para a esquerda são os valores da curva ROC no gráfico, mais sensibilidade e menos resultados falsos positivos teremos, logo mais acurado. Observe a imagem a seguir:
Podemos a partir do gráfico acima perceber que o teste azul se demonstrou melhor em termos de sensibilidade e especificidade (por apresentar menores taxas de falsos positivos) do que o teste amarelo e verde. Assim, Curvas ROC podem ser úteis, por exemplo, para se obter o valor de corte mais acurado em um teste para a determinação de um resultado como positivo ou negativo.
Análise crítica de testes diagnósticos
Se você está se perguntando qual dos parâmetros escritos é mais útil para avaliar um teste diagnóstico – sensibilidade, especificidade, RVs ou curva ROC – a resposta é: depende! Cada parâmetro descreve uma característica específica do teste, e a utilidade de cada parâmetro dependerá de como você usará o teste. Agora que você entende esses conceitos, interpretar o resultado de um teste será muito mais do que apenas ver o resultado [3].
Há diferentes maneiras em que as variáveis dos testes diagnósticos poderiam ser comparadas. A Curva ROC da sensibilidade contra “1 − especificidade” de dois testes diferentes é a mais clássica. A Curva ROC resume o teste diagnóstico e permite tirarmos conclusões visuais, logo, torna-se mais simples a interpretação. Deste exemplo, podemos concluir que ambos têm boa precisão; entretanto, o teste 1 apresenta área sob a curva (ASC) = 0,946 e o teste 2 apresenta ASC = 0,832 o que significa que o teste 1 é de modo geral mais preciso para discriminar entre pacientes com e sem doença. Esta figura foi criada com dados fictícios [3].
Autores: Acássio Farias Barbosa, Beatriz da Silva Rodrigues, Guilherme Fernando Araújo da Rocha, Katia Cilene Gonçalves, Lillian Santos Santana, Rebeca de Oliveira e Thiago Cruz de Moraes Rego, alunos de graduação da Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Citar como: Barbosa A, Rodrigues BS, Rocha GFA, Gonçalves KC, Santana LS, Oliveira R, Rego TCM. Estudantes para Melhores Evidências (EME) Cochrane. Disponível em: [colar link]. Acessado em [dia, mês e ano].
Referências
[1] Altman DG, Bland JM. Diagnostic tests. 1: Sensitivity and specificity. BMJ. 1994;308(6943):1552.
[2] Rocha GFA, Riera R. Características de um teste diagnóstico. Estudantes para as melhores evidências (EME) Cochrane. Disponível em: https://eme.cochrane.org/caracteristicas-de-um-teste-diagnostico. Acessado em 02/04/2023.
[3]Ferreira JC, Patino CM. Understanding diagnostic tests. Part 1. J Bras Pneumol. 2017;43(5):330. https://doi.org/10.1590/s1806-37562017000000330
[4] Patino CM, Ferreira JC. Understanding diagnostic tests. Part 2. J Bras Pneumol. 2017;43(6):408. https://doi.org/10.1590/s1806-3756201700000042.
[5] Altman DG, Bland JM. Diagnostic tests 3: receiver operating characteristic plots. BMJ. 1994;309(6948):188. https://doi.org/10.1136/bmj.309.6948.188
[6] Sores ANS et.al. Capítulo 5. Artigos sobre testes diagnósticos. Leitura Crítica de Artigos Científicos. Belo Horizonte – MG: SBOC, 2011. p.85, p.86, p.87. Disponível em: https://www.sboc.org.br/app/webroot/leitura-critica/LEITURA-CRITICA_C5.pdf. Acessado em 02/04/2023.
[7] Soares NS et.al. Capítulo 5. Artigos sobre testes diagnósticos. Leitura Crítica de Artigos Científicos. Belo Horizonte – MG: SBOC, 2011. p.83. p.84. p.85. p.87 p.88. p.89 Disponível em: https://https://www.sboc.org.br/app/webroot/leitura-critica/LEITURA-CRITICA_C5.pdf Acessado em 02/04/2023.