Ensaios clínicos de superioridade, equivalência e não-Inferioridade 

Publicado por 11 de Março de 2024 em

Uncategorised

Contexto 

De acordo com a hipótese inicial levantada pelos pesquisadores, um ensaio clínico pode ter como objetivo avaliar se uma intervenção é: 

  • superior ou não quando comparada com um a comparador; 
  • equivalente ou não ao comparador;  
  • não inferior ou inferior ao comparador [1]. 

 

Para responder de modo mais apropriado a cada um destes tipos de objetivos, há diferentes delineamentos de ensaios clínicos. 

 

Ensaios clínicos de superioridade 

São planejados e conduzidos com a finalidade de melhorar as atuais práticas de saúde e, para isso, hipotetizam que uma nova intervenção seja melhor, em termos de eficácia e segurança, do que placebo, nenhuma intervenção ou uma outra intervenção ativa [1,2]. 

Quando um ensaio clínico de superioridade não consegue comprovar a superioridade de uma intervenção sobre outra, isso não significa que estas intervenções sejam equivalentes. Isso ocorre porque no estudo de superioridade são assumidas premissas numéricas (idealmente com base em diferenças clínicas minimamente significantes para os desfechos) para definir a superioridade de uma intervenção sobre a outra [1,2]. 

 

Exemplo 

O estudo fictício PAINLESS 2021 definiu que, para ser considerado superior ao analgésico A, a frequência de participantes que apresentou melhora da dor no joelho no grupo que recebeu o analgésico B deveria ser pelo menos 30% maior do que no grupo que recebeu o analgésico A. Este estudo também definiu o desfecho ‘melhora da dor’ como uma redução da dor no joelho em pelo menos 3 pontos quando medida em uma escala numérica de 0 a 10 (quanto maior a pontuação, maior a dor). Se a diferença de frequência de participantes com melhora da dor for 25% entre os analgésicos, o analgésico B não será considerado superior ao analgésico A neste estudo. Mas este resultado pode não significar também que os analgésicos sejam equivalentes, uma vez que para afirmar equivalência a literatura assume uma diferença máxima entre os analgésicos de 10% [2]. 

 

Ensaios clínicos de equivalência 

O ensaio clínico de equivalência tem como finalidade avaliar se duas ou mais intervenções são equivalentes em termos de eficácia e segurança. São geralmente conduzidos para identificar mais uma opção preventiva ou terapêutica, muitas vezes tentando buscar uma alternativa mais econômica, ou que esteja associada a maior adesão, ou seja mais acessível para uma condição [1,2] 

 

Ensaios clínicos de não-inferioridade 

Quando já existe um tratamento de referência ou padrão (R/S) para a condição de saúde estudada, pode ser considerado antiético realizar um ensaio clínico comparando uma intervenção experimental (‘E’) com placebo (‘P’), sendo que o ideal é a comparação de ‘E com R’. No entanto, há casos nos quais não é possível demonstrar se E é superior a ‘R’ e, dessa forma, diferentes abordagens são adotadas para verificar se a nova intervenção proposta é equivalente ou, no mínimo, não inferior ao tratamento de referência [2]. Esses dois casos representam, respectivamente, os ensaios clínicos de equivalência e os ensaios clínicos de não-Inferioridade.  

 

A Figura 1 apresenta o esquema comparativo para os ensaios clínicos de superioridade, equivalência e não-Inferioridade [2]. 

 

Figura 1. Comparação dos ensaios clínicos de superioridade, equivalência e não-Inferioridade [2]. 

Fonte: Schumi, 2011 [2]. Traduzido e adaptado de Schumi (2011) 

 

Para avaliar se uma intervenção é superior ao tratamento de referência, define-se uma margem (λ) do quanto ‘E’ deve superar ‘R’. Sendo assim, se o intervalo de confiança (IC) de ‘E’ ultrapassar essa margem estipulada, a intervenção é considerada como superior ao padrão-ouro (Figura 1A) [2]. 

Para avaliar se intervenção é equivalente ao tratamento de referência n são definidas as margens inferior (-𝛾) e superior (+𝛾) para as quais ‘’’E não deve ser, respectivamente, menor e maior em relação a ‘R. Neste caso, caso o IC do estudo fique dentro do intervalo -𝛾 e +𝛾 o tratamento pode, então, ser considerado como equivalente à referência. Além disso, percebe-se a bilateralidade da análise do teste de equivalência, que permite que a nova intervenção seja melhor, mas também pior com relação à intervenção de referência (Figura 1B) [2]. 

Para avaliar se intervenção não é inferior ao tratamento de referência, o limite definido é o inferior (-𝚫) (Figura 1C). O IC que resulta do estudo de comparação entre E e R não pode ultrapassar a essa margem pré definida – o que demonstra a unilateralidade desse teste -, tendo em vista que, caso ultrapasse, a intervenção em relação à referência poderá ser considerada de duas formas: 

  • inferior, caso todo o IC seja menor que -𝚫; e 
  • indeterminado, caso uma parte do IC seja maior e outra parte seja menor que -𝚫 [2]. 

Essas margens definidas em ambos os desenhos de estudo são chamadas, também de zona de indiferença, regiões relativas ao IC dentro das quais as intervenções são consideradas equivalentes ou não superiores. A Figura 2 apresenta um esquema com os cenários possíveis de diferenças de tratamento observadas com relação aos eventos adversos em ensaios clínicos de não inferioridade [2]. 

 

Figura 2. Cenários possíveis de diferenças de tratamento observadas com relação aos eventos adversos em ensaios clínicos de não inferioridade [1].
Fonte: Piaggio, 2006 [1]. Traduzido e adaptado de Piaggio (2006) 

 

Em estudos de não-inferioridade, é possível observar casos de superioridade, não inferioridade, inconclusão e inferioridade com relação a eventos adversos, por exemplo. No caso de A, ocorre um caso de superioridade do novo tratamento, em que o IC é contido todo à esquerda do eixo. Nos casos de B e C, observa-se casos de não inferioridade e não superioridade, nos quais o IC está contido à esquerda de 𝚫, mas passa pelo eixo. No caso de D, também vemos um caso de não inferioridade, porém com a possibilidade de excluir a hipótese nula entre as intervenções. Em E e F, os quais ultrapassam 𝚫 e o eixo, obtemos um resultado inconclusivo com relação à não inferioridade, no entanto, sem significância estatística com relação à eficácia para os efeitos adversos. No caso de G, há um resultado inconclusivo para a não inferioridade, porém com possibilidade de concluir que o novo tratamento é menos eficaz que o tratamento de referência. Por fim, em H, como o IC está todo à direita de 𝚫, nota-se a inferioridade do novo tratamento [1]. 

 

Conclusão 

Os estudos de equivalência procuram determinar se uma nova intervenção é semelhante ao tratamento referência. 

Os estudos de não-inferioridade avaliam se a intervenção pode ser considerada não inferior e termos de eficácia, uma vez que com relação a aspectos como custos, disponibilidade e/ou acessibilidade ela já apresenta benefícios sobre o tratamento referência.  Neste cenário, é plausível aceitar uma pequena redução da eficácia da intervenção (a qual deve ser determinada no início do estudo), comparada ao tratamento referência, desde que ela seja superior a esta em pelo menos um dos aspectos que não dizem respeito à eficácia.  

 

 

Autores: Matheus Aparecido de Toledo e Yuri Yokoyama do Nascimento. Alunos Alunos de graduação, Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).  

  

Supervisora: Rachel Riera. Professora adjunta, Disciplina de Medicina Baseada em Evidências, Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 

 

Citar como:  Toledo MA, Nascimento YY, Riera R. Ensaios clínicos de superioridade, equivalência e não-Inferioridade. Estudantes para melhores evidências. Cochrane. Disponível em: [adicionar link da página da web]. Acessado em [adicionar dia, mês e ano de acesso].   

 

Referências 

  1. Piaggio G, Elbourne DR, Altman DG, Pocock SJ, Evans SJW, CONSORT Group. Reporting of noninferiority and equivalence randomized trials: an extension of the CONSORT statement. JAMA. 2006;295(10):1152-1160. doi:10.1001/jama.295.10.1152 
  2. Schumi, J., Wittes, J.T. Through the looking glass: understanding non-inferiority. Trials 12, 106 (2011). https://doi.org/10.1186/1745-6215-12-106 
  3. Students 4 Best evidence [website homepage]. Non-Inferiority Trials: Understanding the Concepts. Disponível em: https://s4be.cochrane.org/blog/2022/03/18/understanding-non-inferiority-trials/. Acessado em 20 de novembro de 2023. 
  4. Treadwell JR, Uhl S, Tipton K, Shamliyan T, Viswanathan M, Berkman ND, Sun X, Coleman CI, Elshaug AG, Singh S, Wang SY, Ramakrishnan R. Assessing equivalence and noinferiority. Journal of Clinical Epidemiology. 2012;65. 2, DOI:https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2012.05.001 
  5. Greene, Carolyn J et al. Noninferiority and Equivalence Designs: Issues and Implications for Mental Health Research. Journal of Traumatic Stress.2008;21(5): 433-439. DOI: 10.1002/jts.20367. 

 

Tags:

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Subscribe to our newsletter

You will receive our monthly newsletter and free access to Trip Premium.