Monitoramento de horizonte tecnológico (MHT)
Publicado por 13 de Dezembro de 2024 em Estudantes para Melhores Evidências
Contexto
O monitoramento de horizonte é uma ferramenta originada no século XX pelo Comitê Imperial de Defesa da Inglaterra e consiste em um método organizado e sistemático de busca, investigação e análise de evidências relevantes para a organização de uma instituição, seja ela um governo, um negócio ou um sistema de saúde, tema explorado neste texto [1]. O objetivo principal do monitoramento de horizonte é suprir a defasagem científica nos processos iniciais de decisão dos gestores. Dessa forma, o monitoramento do Horizonte pode e deve ser aplicado em estágios iniciais da formulação de políticas governamentais, principalmente no âmbito da saúde.
Definição
Na área da saúde, o termo “Monitoramento de Horizonte Tecnológico” (MHT) tem sido utilizado para um tipo de estudo que tem como objetivo mapear tecnologias novas e emergentes. Estas tecnologias podem ser medicamentos, equipamentos, procedimentos, produtos, serviços, programas de saúde, dentre outros.
A identificação de tecnologias novas (recentemente difundidas) e emergentes (aquelas que ainda estão em pesquisa clínica e não são comercializadas) no campo da saúde é fundamental para o aprimoramento e para a elaboração de políticas públicas, considerando o contexto do Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse sentido, o MHT é considerado uma fase específica no processo de Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) e subsidia processos de decisão desde a fase de pesquisa e desenvolvimento até a regulação no mercado, passando pela incorporação e desincorporação de determinada tecnologia dos serviços e sistemas de saúde [2].
Na prática, MHT pode ser conduzido par algumas finalidades específicas:
- monitoramento de tecnologias com fins de pesquisa e desenvolvimento;
- monitoramento de tecnologias na regulação do mercado;
- monitoramento de tecnologias novas e emergentes para fins de incorporação ao sistema de saúde;
- monitoramento de desempenho de tecnologias novas para continuidade da incorporação, para desincorporação ou para substituição nos serviços de saúde [2].
Assim, um estudo de MHT, quando bem conduzido, pode fornecer as seguintes informações:
- potencial impacto da tecnologia na saúde da população;
- desabastecimento do mercado;
- potencial disponibilidade de genéricos no País;
- potencial abandono do uso da tecnologia.
Métodos para conduzir um MHT
A EuroScan, uma rede internacional de MHT composta por instituições de avaliação de tecnologias em saúde, desenvolveu uma diretriz para planejamento e condução de MHT [3]. A diretriz foi criada para sistematizar os métodos de um MHT e sugere uma estrutura geral que possibilita a adaptação às diferentes realidades pelas agências de ATS de diferentes países. De acordo com a diretriz de MHT da EuroScan, os métodos para o MHT incluem as seguintes fases [4].
Etapa 1: identificação/monitoramento
Envolve a seleção das fontes de informação adequadas para pesquisar o tipo de tecnologia definido. Há três grupos principais tipos de fontes que precisam ser buscadas:
- fontes primárias: contemplam dados sobre os estágios iniciais do desenvolvimento tecnológico e englobam pipelines industriais, órgãos de registro de patentes e plataformas de registro de pesquisas clínicas. Tendem a ser incompletos ou parciais e podem conter conflitos de interesse;
- fontes secundárias: são compilados das fontes primárias e confrontam as evidências existentes. Podem ser obtidas em conferências, periódicos científicos, sociedades médicas, bases de dados comerciais e notificações de agências regulatórias;
- fontes terciárias: são informações disponíveis nas demais fontes selecionadas e analisadas criticamente, como os informes das agências vinculadas à EuroScan. São informações bem trabalhadas e com evidências detalhadas, porém, geralmente, são disponibilizadas tardiamente;
- fontes de informação reativas: contemplam as sugestões de profissionais de saúde, consumidores e gestores dos serviços de saúde no que tangem tecnologias com relevância expressiva para o manejo da saúde [4].
Etapa 2: filtragem das tecnologias identificadas
Aplicação de critérios previamente estabelecidos, com base nos objetivos definidos e, minimamente, deve se tratar de uma tecnologia nova ou emergente, possuir um benefício provável ou ser relevante para o desenvolvimento ou atualização de políticas de saúde. Caso a tecnologia não atenda a esses requisitos, ela deve ser descartada e só poderá ser posteriormente utilizada para MHT mediante publicações de novas evidências que a enquadrem nos critérios estabelecidos [4].
Etapa 3: priorização das tecnologias candidatas
Hierarquização das tecnologias com maior impacto no sistema de saúde com base numa escala de prioridades, que pode variar conforme o objetivo do sistema de MHT e as necessidades do cliente.
Geralmente, envolvem critérios como o impacto da doença, potencial impacto da tecnologia para o paciente, eficiência e potencial impacto nos custos, potencial impacto no serviço e na estrutura organizacional e, ainda, potencial impacto para a sociedade.
É importante que o processo de priorização inclua a perspectiva do cliente, mas também de especialistas no tema, gestores de diferentes níveis e grupos de pacientes diversos, para que o processo seja o menos tendencioso possível, uma vez que por si só já envolve a subjetividade e os conflitos de interesse dos envolvidos. Os métodos de análise de decisão multicritério constituem ferramentas interessantes para respeitar as preferências individuais dos gestores, ao mesmo tempo que atuam na decisão de forma clara e objetiva [4].
Etapa 4. avaliação
Sintetize das informações coletadas e hierarquizadas nos passos anteriores, com destaque, para as potenciais repercussões das tecnologias analisadas para a sociedade e os sistemas de saúde, levando em conta os benefícios encontrados aos grupos de pacientes, o desempenho comparado aos métodos atuais e os custos da tecnologia.
As avaliações derivadas dos processos de MHT são classificadas em rápidas, resumidas e completas [4]. A EuroScan orienta sobre a relevância de manter um padrão de seções no relatório de avaliação que inclua: informações relacionadas à tecnologia, informações relacionadas aos pacientes, predição do impacto e evidências [4].
O maior obstáculo da avaliação é lidar com evidências parciais, uma vez que, se tratando de tecnologias emergentes, muitas vezes não é possível prever todos os impactos futuros da inovação em questão [4].
Etapa 4. revisão por pares
A revisão por pares ocorre em todas as etapas do MHT, mas nesta etapa ela desempenha o papel de verificar a qualidade do relatório produzido. Desse modo, recomenda-se que haja uma avaliação externa, realizada por especialistas no assunto, para garantir que o MHT contemple diversas perspectivas.
Etapa 5. disseminação
Veiculação da informação produzida de modo que ela atinja o público-alvo. O primeiro passo para que esse processo seja adequadamente realizado é determinar o público-alvo e os meios de circulação mais apropriados. A informação produzida pode ser publicada em formato impresso ou online e pode ser dirigida à população ou limitada a um grupo específico.
No Brasil, Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) divulga os resultados de um MHT por meio de alertas, informes ou capítulos em relatórios nos quais são revelados os resultados obtidos [3].
Para saber mais sobre a Conirec, veja o texto deste blog disponível em: https://eme.cochrane.org/conitec/ [5].
Etapa 6. atualização da informação
Manutenção da atualização das informações, que deve ser realizada de forma periódica, englobando os novos estudos finalizados e as evidências relatadas.
Considerações finais
O MHT exerce um papel fundamental na identificação de novas tecnologias, na incorporação no sistema de saúde e na avaliação antecipada das demandas por tecnologias em saúde que podem ter impacto relevante no futuro.
Autores: Julia Filardi de Toledo Leme, Júlia Rodrigues Lage, Luana Andrioli Parmigiani, Maria Fernanda Rodrigues de Menezes, Natália Rodrigues Molinari, Pedro Henrique Fabres Franco. Alunos de graduação da Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Supervisora: Rachel Riera. Professora associada, Disciplina de Medicina Baseada em Evidências, Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Citar como: Leme JFT, Lage JR, Parmigiani LA, Menezes MFR, Molinari NR, Franco PHF. Monitoramento de horizonte tecnológico. Estudantes para Melhores Evidências. Cochrane. Disponível em: [adicionar link da página da web]. Acessado em [adicionar dia, mês e ano de acesso].
Referências
- Ministério da Saúde. Monitoramento do Horizonte Tecnológico no Brasil: Avanços e Desafios. 1. ed. Brasília; 2017.
- Ministério da Saúde (BR). Monitoramento de Tecnologias em Saúde [Internet]. [Brasília]: Ministério da Saúde (BR); 30 Mai 2022 [revisado 10 Jun 2024; citado 15 Nov 2024]. Disponível em: https://www.gov.br/conitec/pt-br/assuntos/avaliacao-de-tecnologias-em-saude/monitoramento-de-tecnologias-em-saude#monitoramento-de-tecnologias. Acessado me 18 de novembro de 2024
- Conitec. Monitoramento do Horizonte Tecnológico (MHT) [Internet]. Conitec; 28 set 2020 [citado 15 nov 2024]. Vídeo: 2:42 min. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=q-Ngfi30ln4. Acessado me 18 de novembro de 2024.
- EuroScan International Network, A toolkit for the identification and assessment of new and emerging health technologies, 2014, EuroScan International Network: Birmingham. Editado por Drª Sue Simpson, Secretaria da EuroScan. Tradução para o português pelo Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias e Inovação em Saúde do Ministério da Saúde e convidadas. Outubro/2019.
- Caldas BR, Oliveira GAR, Campos GR, Valente GM, Santos HMCJ, Martins LM, Dias MCBM. Conitec. Estudantes para Melhores Evidências da Universidade Federal de São Paulo. Cochrane. Disponível em: https://eme.cochrane.org/conitec/. Acessado me 18 de novembro de 2024