Avaliação da certeza da evidência (abordagem GRADE).

Publicado por 28 de Janeiro de 2022 em

Tutoriais e Fundamentos

Para entendermos a avaliação da certeza de uma evidência a abordagem GRADE (The Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation)1, primeiro precisamos falar sobre confiança. Profissionais de saúde, gestores de políticas em saúde e pacientes precisam saber o grau de certeza que temos nos resultados do conjunto de evidências utilizadas para embasar as recomendações em saúde. Portanto, identificar a certeza que temos em uma evidência não é uma tarefa simples e requer métodos rigorosos, estruturados e transparentes. 

Sabemos que as revisões sistemáticas metodologicamente adequadas são consideradas o nível mais alto de evidência para auxiliar na tomada de decisão. Uma das etapas de uma revisão sistemática é justamente a avaliação da certeza do conjunto de evidências obtidas após o processo de mapeamento, avaliação e síntese dos estudos que melhor respondem a uma pergunta de pesquisa. Em um cenário hipotético, ao se deparar com um paciente com diagnóstico de enxaqueca crônica, um médico se utiliza de uma revisão sistemática recente para auxiliar sua recomendação. Os resultados da revisão utilizada pelo médico mostram que há evidência de certeza moderada para o uso de um analgésico específico em relação à melhora da dor e da qualidade de vida. 

Mas o que significa “certeza moderada”? Como podemos interpretar este sumário da certeza das evidências fornecido em uma revisão sistemática e aplicá-lo na prática?  

A abordagem GRADE 

A abordagem GRADE foi desenvolvida por um grupo de pesquisadores (o GRADE Working Group – https://www.gradeworkinggroup.org/) com o objetivo de avaliar e graduar a certeza do conjunto de evidências em uma revisão sistemática, ou seja, a confiança que depositamos sobre a eficácia e segurança de um tratamento, por exemplo. O GRADE classifica a certeza das evidências em quatro níveis:  

  1. Alta: Há confiança de que o efeito estimado esteja próximo ao verdadeiro efeito da intervenção. É improvável que estudos futuros alterem a confiança na estimativa do efeito. 
  1. Moderada: Há confiança moderada no efeito estimado. É provável que novos estudos possam impactar a confiança na estimativa do efeito e talvez modificá-la. 
  1. Baixa: A confiança no efeito estimado é limitada. É provável que estudos futuros tenham um impacto importante na estimativa do efeito e provavelmente modificá-la. 
  1. Muito baixa: Há importante grau de incerteza na estimativa do efeito. 

 

Em resumo, identifica-se o desenho dos estudos primários incluídos na revisão sistemática em questão. Ensaios clínicos randomizados possuem, inicialmente, alta certeza de evidência pois, quando conduzidos de maneira adequada, são o melhor desenho de estudo para responder a questões sobre tratamento. Os estudos observacionais (nos quais não há randomização) são passíveis de vieses que podem influenciar os efeitos de uma intervenção, e por esta razão partem de baixa certeza de evidência na avaliação do GRADE. A abordagem GRADE possui critérios que reduzem ou aumentam a certeza do conjunto de evidências em 1 ou 2 níveis, de acordo com a Tabela 1. Lembrando que esta avaliação é feita para cada desfecho analisado na revisão sistemática, individualmente. 

 

Tabela 1. Critérios para avaliação da certeza da evidência pela abordagem GRADE. 

Fatores que reduzem a certeza da evidência (ensaios clínicos) 
Risco de viés  Qualidade metodológicas dos estudos incluídos. Exemplo: mascaramento inadequado dos participantes, perdas de participantes durante o estudo, etc. 
Inconsistências  Diversidade clínica, metodológica ou estatística entre os estudos incluídos. Exemplo: estudos que avaliam o mesmo tratamento e apresentam resultados divergentes. 
Evidência indireta  Componentes da pergunta de interesse (população, intervenção, comparador e/ou os desfechos analisados) incoerentes entre estudos. Exemplo: estudos que avaliam crianças em uma revisão sistemática cuja população interesse são adultos. 
Imprecisão  Pequeno tamanho de amostra; poucos eventos nos grupos comparadores (por exemplo, a ocorrência de poucos eventos adversos); amplo intervalo de confiança. 
Viés de publicação  Publicação com base na força dos achados. Exemplo: estudos que não mostram efeito positivo de uma intervenção têm menos probabilidade de serem publicados. 
Fatores que aumentam a certeza da evidência (estudos observacionais) 
Magnitude do efeito  Forte evidência de associação entre causa e efeito, por exemplo, para alguns tratamentos há extrema confiança em sua efetividade.  
Presença do gradiente dose-resposta  Quanto maior a exposição maior o efeito. Exemplo: doses maiores de determinado medicamento mostram melhores resultados. 
Fatores de confusão residuais  Alguns fatores de confusão residuais (Não mensurados ou não identificados) associados aos desfechos de interesse do estudo podem subestimar o resultado encontrado e aumentar a confiança no efeito.  

 

Em conclusão, a tomada da decisão clínica com base em resultados de revisões sistemáticas é melhor embasada pela avaliação da certeza da evidência com a abordagem GRADE. Com o grande número de publicações atualmente é imprescindível poder contar com um sistema que nos dá confiança no momento de da tomada de decisão em saúde. 

O GRADE continua em constante desenvolvimento. Recomendamos como leitura complementar a série de artigos sobre o GRADE publicados periodicamente na revista Journal of Clinical Epidemiology, os quais descrevem em detalhes a metodologia empregada na abordagem GRADE. 

Autora: Giullia Carvalho Mangas Lopes, aluna da Universidade Metropolitana de Santos (UNIMES). 

Referências 

  1. Guyatt GH, Oxman AD, Vist GE, Kunz R, Falck-Ytter Y, Alonso-Coello P, Schünemann HJ; GRADE Working Group. GRADE: an emerging consensus on rating quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2008 Apr 26;336(7650):924-6. doi: 10.1136/bmj.39489.470347.AD. 
  2. The GRADE working group, 2004-2021 [online]. Disponível em: https://www.gradeworkinggroup.org/#pub
  3. BMJ Best Practice. What is GRADE?, 2020 [online]. Disponível em: bestpractice.bmj.com/info/toolkit/learn-ebm/what-is-grade/
  4. Kuusi T. GRADE and quality of evidence, 2018 [online]. Students 4 Best Evidence. Disponível em: s4be.cochrane.org/blog/2018/10/05/grade-and-quality-of-evidence

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