Entendendo o valor de p

Publicado por 18 de Abril de 2022 em

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Contexto 

Este post começa dizendo que não existe uma interpretação do valor de p que seja ao mesmo tempo simples, intuitiva, correta e infalível [1].

A utilização e a interpretação corretas do valor de p requerem uma atenção ao detalhe que testa a nossa paciência e a nossa cognição. Esta exigência cognitiva tem levado à adoção de atalhos para definições e interpretações que são completamente equivocadas, e que continuam chegando até nós durante nosso aprendizado, seja na graduação ou na pós-graduação. 

Definição 

O foco das definições tradicionais do valor de p tem sido a hipótese nula, assumindo que todas as demais hipóteses assumidas para calcular o valor p são reconhecidas como corretas. Como este e outros pressupostos são frequentemente questionáveis, se não injustificados, é mais apropriado utilizar uma visão mais geral do valor p.   

Assim, o valo de p pode ser definido como um resumo estatístico sobre a compatibilidade entre os dados observados e aqueles que poderíamos prever ou esperar se soubéssemos que todo o modelo estatístico (todas as premissas utilizadas para calcular o valor de p) estava correto.  Esta definição nos ajudar a compreender porque os testes estatísticos nos dizem muito menos do que muitos pensamos que eles dizem: um valor de p (i) não nos diz se a hipótese escolhida para os testes é verdadeira ou não; e (ii) não diz nada especificamente relacionado com essa hipótese, a menos que possamos estar completamente seguros de que qualquer outra hipótese utilizada para o seu cálculo é correta – uma garantia que falta na maioria dos estudos [1]. 

O valor de p pode ser visto como uma medida contínua da compatibilidade entre os dados e todo o modelo utilizado para o seu cálculo, variando entre 0 (incompatibilidade total) e 1 (compatibilidade perfeita) e, neste sentido, pode ser visto como uma medida da adequação do modelo aos dados analisados [1].

Interpretação do valor de p 

Em estudos na área da saúde, é frequente dicotomizar o valor de p utilizando o ponto de corte de 0,05 para indicar se hipótese nula pode ou não ser rejeitada com um nível de segurança.  O Quadro 1 apresenta uma interpretação simplificada, mas adequada do valor de p. 

Quadro 1. Interpretação resumida do valor de p. 

Significância estatística versus relevância clínica. 

Quando há um p < 0,05, costuma-se dizer que “há significância estatística”. Mas, nem sempre esta significância estatística está associada a uma relevância clínica do resultado. 

Para exemplificar, considere um ensaio clínico que comparou um novo fio com o fio tradicional utilizado para sutura simples de pele. Diferentes resultados hipotéticos para o desfecho “frequência de cicatrização completa”, mensurada no dia 10, estão apresentados no Quadro 2. Agora discuta com seus colegas sobre qual seria a sua conduta quanto à escolha do fio de sutura considerando os cenários 1 a 6.  

Quadro 2.  Valores de p e IC 95% para diferentes estimativas de tamanho do efeito. Comparação: fio novo versus fio tradicional para sutura de pele. Desfecho: probabilidade de cicatrização completa após 10 dias. 

Erros frequentes ao interpretar o valor de p  

  • Ignorar a qualidade da amostra, pois pode haver vieses e erros aleatórios em sua escolha;  
  • Ignorar o desenho do estudo e sua adequação à pergunta de interesse; 
  • Assumir que o valor de p consegue mensurar o tamanho e a relevância clínica de um efeito e, assim, direcionar a tomada de decisão [2].

 

Conclusão 

O valor de p é uma medida com definição complexa e cuidado deve ser tomado para interpretá-lo adequadamente. Ele permite estabelecer se podemos ou não afastar a hipótese nula com segurança. Entretanto, não é capaz de mostrar o exato tamanho do efeito identificado em um estudo e por isso não permite a análise da relevância clínica dos resultados de um estudo. 

Autores 

Pedro Henrique de Mattos Cavalcante, Paulo Victor Gomes Ramos, Vitor Dainese Pereira e Otávio Augusto de Tralli Silva. Alunos de graduação, Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).  

Supervisores 

Rachel Riera, MD, MSc, PhD. Professora adjunta, Escola Paulista de Medicina (EPM), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Rafael Leite Pacheco, MD, MSc. Professor, Centro Universitário São Camilo (CUSC).  

 

Citar como: Cavalcante PHM, Ramos PVG, Pereira VD, Tralli Silva OA. Pacheco RL, Riera R. Entendendo o valor de p. Estudantes para as melhores evidências (EME) Cochrane. Disponível em: [colar link]. Acessado em [dia, mês e ano]. 

 

Referências 

  1. Greenland S, Senn SJ, Rothman KJ, Carlin JB, Poole C, Goodman SN, Altman DG. Statistical tests, P values, confidence intervals, and power: a guide to misinterpretations. Eur J Epidemiol. 2016;31(4):337-50. doi: 10.1007/s10654-016-0149-3. Epub 2016 May 21. PMID: 27209009; PMCID: PMC4877414. 
  2. Hung TQ. Key to statistical result interpretation: P-value in plain English. Students for best evidence. Postado em 21 de março de 2016. Disponível em: https://s4be.cochrane.org/blog/2016/03/21/p-value-in-plain-english-2/. Acessado  em 10 de abril de 2022. 

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